“Que projeto de estado nós, trabalhadoras e trabalhadores queremos? Dia 30/10 daremos esta resposta”
Sim, ela está de volta: a Proposta de Emenda à Constituição 32 (Reforma Administrativa), um projeto pessoal do atual presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) e do seu ministro da Economia, Paulo Guedes. Com novo texto aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, é verdade, mas embora a roupagem tenha mudado, a essência continua a mesma: sucatear o Serviço Público brasileiro. E o presidente da Câmara ameaça tocar sua tramitação na Casa. Logo após ser reeleito, Arthur Lira (PP) não perdeu tempo em afirmar em entrevista que o Congresso continuará “liberal e reformista”.
Se você, servidora/servidor pública/o ainda não sabe para o perigo da proposta, pedimos que leia com atenção o texto até o fim.
A primeira coisa que você precisa saber é que a PEC vai atingir todo mundo. Você está perto de aposentar? Nem você vai escapar! O projeto pega as/os atuais servidoras/es em vários pontos. Para a/o futura/o servidor/a, vai ser muito pior. Consequentemente, o desmonte vai acabar atingindo a própria população. Com um Serviço Público lotado de cargos por indicação, a investigação por qualquer desvio ou corrupção não terá lugar, por exemplo. E a preocupação e indignação deve ser de todas/os.
Vamos aos pontos:
Artigo 37-A – Cooperação com órgãos privados e fim do concurso público
Com a inclusão do Artigo 37-A na Constituição, União, Estados e Municípios poderão executar seus serviços por cooperação com órgãos privados. Ou seja, a Constituição passa a autorizar que Saúde, Educação, Assistência e demais serviços poderão ser entregues a empresas privadas, acabando com o concurso público. Também poderão ser contratados temporários, sem carreiras e sem uma série de direitos, por até dez anos.
Artigo 23 – Fim da licença-prêmio e outros direitos
O artigo 23 do projeto traz o texto: “é vedada a concessão a qualquer servidor ou empregado da administração pública direta ou de autarquia, fundação, empresa pública ou sociedade de economia mista de:
- Férias superior a trinta dias pelo período aquisitivo de um ano;
- Adicionais referentes a tempo de serviço, independentemente da denominação adotada;
- Aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos;
- Licença-prêmio, licença-assiduidade ou licença decorrente de tempo de serviço, independentemente de denominação adotada, ressalvada, dentro dos limites da lei, licença para fins de capacitação;
- Redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração, exceto de decorrente de limitação de saúde, conforme previsto em lei
Licenças decorrentes do tempo de serviço são decorrentes de lutas históricas da classe trabalhadora e sua retirada será um retrocesso. Enquanto o mundo adere cada vez mais à jornada reduzida de trabalho, o que tem mostrado resultados positivos na produtividade, além de ser extremamente positivo para a saúde das/os trabalhadoras/es, aqui no Brasil querem impedir a redução da jornada a todo e qualquer custo.
Como ficam os cargos?
A reforma propõe criar dois tipos de cargos: por tempo indeterminado e cargo típico de estado.
O primeiro não terá direito à estabilidade. O ingresso será por concurso público, mas com vínculo precário de experiência mínima de um ano. Após este período, apenas as/os mais bem avaliadas/os (não sabemos por quais critérios) serão efetivadas/os. Mesmo assim, correm o risco de desligamento a qualquer momento. A reforma estabelece novas hipóteses legais de demissão do que as já existentes.
São consideradas carreiras típicas de estado as funções “essenciais e estratégicas”: Segurança Pública, auditor, Advocacia Pública, magistrado, promotor, diplomata, etc. Estas funções, no entanto, não foram definidas na PEC. Desta forma, não sabemos quem será poupado da degola, mas é possível imaginar. Dificilmente atingirá as carreiras privilegiadas. Não é o caso da grande maioria das/os servidoras/es. Provavelmente, não é o seu caso também!
Neste segundo grupo, o ingresso também será por concurso público. O período de experiência será de dois anos no mínimo. Apenas as/os mais bem avaliadas/os serão efetivadas/os. Terão estabilidade apenas após três anos (dois de experiência e um no cargo efetivo). Podem perder o cargo por decisão transitada em julgado ou por órgão judicial colegiado; ou por avaliação periódica de desempenho.
O texto ainda prevê a criação de duas novas possibilidades de vínculo: um para cargos por prazo determinado e outro para cargo de liderança e assessoramento.
Por que é importante ter estabilidade?
A estabilidade existe para impedir que cargos sejam disponibilizados para atender a interesses dos mandatos políticos, que são passageiros. Também é importante para impedir o nepotismo.
Com o fim da estabilidade e a possibilidade de transferir cargos técnicos e estratégicos a servidoras/es que não são de carreira e são indicados políticos, as chances de impactos negativos no andamento de processos e serviços é imensa, fora a facilidade de esquemas de corrupção. Além de ser prejudicial ao Serviço Público e às/aos trabalhadoras/es, este sistema consequentemente irá prejudicar o atendimento à população. É um caminho sem volta para o sucateamento da iniciativa pública e consequente enfraquecimento do estado.
E os direitos adquiridos?
As/os servidoras/es estáveis ingressas/os até a promulgação da lei se a PEC for aprovada, não poderão ser demitidas/os em razão da extinção de cargos, mas serão submetidas/os aos critérios demissionais da avaliação de desempenho. Como será esta avaliação? Ninguém sabe.
O que você pode fazer
A ameaça de aprovação da Reforma Administrativa ronda o funcionalismo desde 2018 com a eleição de Bolsonaro. Ano passado após ampla mobilização, a categoria conseguiu barrar seu andamento por tempo limitado. Agora com a composição da Câmara dos Deputados e Senado já definida volta à tona a tramitação da PEC. O cenário é totalmente desfavorável a nós da classe trabalhadora. Se o Congresso já era conservador e favorável a reformas neoliberais, com a nova legislatura que vem por aí, a situação tende a se aprofundar. Bolsonaro conseguiu eleger grande parte de seus apoiadores. São parlamentares que defendem a retirada de direitos das/os servidoras/es e da população a qualquer custo e defendem a manutenção do orçamento secreto (um eufemismo bondoso para corrupção instituída). Se você ainda não entendeu a ligação entre as duas coisas a gente explica: quanto mais se corta das políticas públicas e das/os trabalhadoras/es, mais sobra para as emendas parlamentares e se for possível fazê-las sem deixar rastros de exatamente onde e como o dinheiro será destinado, melhor ainda.
O chamado Centrão, aquele grupo de pequenos partidos que se juntaram e que vendem seu apoio em troca de favores, cresceu seu número nas cadeiras do Congresso. Infelizmente foram eleitas/os com os votos de muitas/os servidoras/es, que ainda não entenderam o que está em jogo.
O primeiro passo para você servidor/a combater mais este projeto que vai atingir em cheio a sua vida e da sua família é se enxergar como classe trabalhadora. Você não é elite, não tem privilégios. Quando eles dizem que vão propor reformas para “acabar com os marajás” é de você que estão falando. Sim, você que está vendo seu salário ser engolido pela inflação há anos, você que trabalha cada vez mais e não dá conta de pagar os boletos, você que fica assustada/o cada vez que vai ao mercado e vê os produtos cada vez mais caros. As/os verdadeiras/os privilegiadas/os sempre são poupados das ditas reformas, você não. Você é colocado como “parasita”, como Guedes insinuou mais de uma vez, o culpado pelos rombos das contas públicas. Enquanto apontam o dedo para você, “a boiada passa no Congresso”.
Agora chegou a hora de todas/os se envolverem ativamente nas mobilizações. Se a resistência não for forte, vai passar. Vá além do ligar e cobrar os sindicatos e associações nas redes sociais. Troque o “o que vocês estão fazendo?” pelo “o que nós vamos fazer?”.
Dia 30 de outubro teremos não apenas o segundo turno das eleições, mas a decisão mais importante sobre o futuro que queremos para nós e para o país. Qual projeto de estado nós queremos? A decisão está nas nossas mãos.